Teologia Ascética e Mística: Da Parte de Jesus na vida Cristã (Parte I)
É toda a Santíssima a Trindade que nos confere esta
participação da vida divina que foi descrita nas postagens anteriores. Mas a
Santíssima Trindade o faz por causa dos méritos e satisfações de Jesus Cristo,
por este motivo desempenha um papel essencial em nossa vida sobrenatural que se
chama com toda a razão de vida cristã.
Conforme a doutrina de São Paulo, Jesus Cristo é a cabeça da
humanidade regenerada, como Adão o tinha sido de toda a raça humana em seu
berço, mas de modo muito mais perfeito: Pelos seus méritos Jesus nos reconquistou
os nossos direitos a graça e a glória: pelos seus exemplos mostra-nos como
devemos viver, para assim nos santificarmos e vivermos no Céu; mas é, antes de
tudo, a cabeça de um corpo místico de que nós somos os membros: é pois, a causa
meritória, exemplar e vital de toda a nossa santificação.
Quando dizemos que Jesus é a causa meritória de nossa
santificação, tomamos esta palavra no seu sentido mais lato, em quanto
compreende a um tempo a satisfação e a um mérito: “Propter nimiam caritatem qua dilexit nos, sua sanctissima passione in
ligno crucis nobis justificationem meruit et pro nobis satisfecit”.
Logicamente a satisfação precede o mérito, neste sentido que
é mister reparar primeiro a ofensa feita a Deus, pra obter o perdão dos nossos
pecados e merecer a graça; mas em realidade todos os atos livres de Nosso
Senhor eram aos mesmo tempo satisfatórios e meritórios; e todos tinham valor
moral infinito. Não nos resta tirr destas verdades algumas conclusões.
Não há pecado irremissível, contanto que contritos e
humilhados, deles peçamos confiadamente perdão. É o que fazemos no santo
tribunal da penitência, onde a virtude do sangue de Jesus Cristo nos é aplicada
por intermédio do ministro de Deus. É ainda o que fazemos no santo sacrifício
da missa, onde Jesus continua a oferecer-se, pelas mãos do sacerdote, como vítima
de propiciação, excitando em nossa alma um sentimento profundo de contrição, tornando-nos
a Deus propícios, e obtendo-nos o perdão cada vez mais completo de nossos, e a
remissão mais abundante da pena que nos devia expiar. Podemos acrescentar que
todos os nossos atos cristãos, unidos aos sentimentos de Jesus, tem valor satisfatório
para nós e para as almas por quem oferecemos.
Jesus também mereceu pra nós todas as graças de que necessitamos,
para atingir o nosso fim sobrenatural e
cultivarmos em nós a vida cristã: “Benedixit
nos in omni benedictione spirituali in coelestibus in Christus Iesu”. Abençoou-nos em cristo,
com toda a sorte de bênçãos espirituais: graças de conversão, graças de perseverança,
graças para resistir as tentações, graças para bem nos aproveitarmos das provações,
graças de consolação no meio dos trabalhos, graças de renovação espiritual, graças
de uma segunda conversão, graças da perseverança final, tudo isso nos mereceu
Jesus Cristo: e afirma-nos que tudo quanto pedirmos a seu Pai em seu nome, isto
é, apoiando-nos em seus merecimentos, nos será concedido.
Pra nos inspirar mais confiança, instituiu os sacramentos,
sinais visíveis que nos confere as graças em todas as circunstâncias importantes
da nossa vida, e nos dão direito as graças atuais que obtemos em tempo
oportuno.
Fez mais ainda: deu-nos o poder de satisfazer e merecer querendo
assim associar-nos a Si mesmo, como causas secundárias. E fazer-nos obreiros da
nossa própria satisfação. Nos concede ainda sobre isso uma condição essencial
de nossa vida espiritual. Se carregou com sua cruz, foi par que nós o seguíssemos,
levando a nossa: “Si qui vult post me
venire, abneget, semetipsum, tollat crucem suam, et sequatur me. Assim o
compreenderam os apóstolos: “Se quisermos ter parte na sua glória, diz São
Paulo, é necessário que tenhamos parte em seus sofrimentos; e São Pedro
acrescenta que se Cristo sofreu por nós, foi para que nós seguíssemos suas
pisadas. Há mais: As almas piedosas se sentem impelidas, como diz São Paulo, a
sofrer alegremente, em união com Cristo, pelo seu corpo místico que é a Igreja;
e assim tem parte na eficácia redentora da sua Paixão e colaboram secundariamente
na salvação de seus irmãos. Como esta doutrina é mais verdadeira, mais nobre,
mais consoladora que a inacreditável afirmação de certos protestantes que tem a
triste coragem de se asseverar que, havendo Cristo padecido suficientemente por
nós, não temos senão que gozar dos frutos da sua redenção, sem de beber de seu cálice.
Com isso pretendem render homenagem a plenitude dos merecimentos de Cristo, quando
esta faculdade de merecer não faz se não dar maior realce a plenitude da redenção.
E na verdade, não será mais honroso para Cristo manifestar a fecundidade das
suas satisfações, associando-nos a sua obra redentora e tornando-nos capazes de
nela colaborar, posto que secundariamente, imitando os seus exemplos?^
(Fonte:
Compêndio de Teologia e Ascética e Mística - AD. Tanquerey - 1961)
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