Teologia Ascética e Mística: Da Parte de Jesus na vida Cristã (Parte II)
Jesus Cristo não contentou de merecer por nós; quis ser
causa exemplar, modelo vivo da nossa vida sobrenatural.
Grande era a necessidade que tínhamos de um modelo deste
gênero; porquanto, para cultivar uma vida, que é uma participação de uma vida
de Deus, é mister aproximar-nos, o mais possível da vida divina. Ora como bem
observa Santo Agostinho, os homens que tínhamos diante dos olhos, eram
demasiadamente imperfeitos, para nos servir de modelos, e de Deus, que é a
mesma santidade, parecia muito distante. Foi então que o Filho eterno de Deus,
sua viva imagem, se fez homem, para nos mostrar, pelos seus exemplos, como é
possível na terra aproximar-nos da perfeição divina filho de Deus e filho de
homem, viveu verdadeiramente uma vida dei
forme, e pode dizer-nos: “Quem me vê também vê o Pai” (Jô 14,9).
Jesus sendo tentado pelo demônio |
Tendo manifestado em suas ações a santidade divina, pôde-nos
propor como possível, a imitação das divinas perfeições: “Estote ergo vos perfecti sicut et Pater vester caelesti perfectus est”
(MT 5,48). É por isso que o Pai nos propõe como modelo: no batismo e na
transfiguração, aparece aos discípulos e diz-lhes, falando de seu Filho: “Hic et filius meus dilectus in quo mihi bene
complacuit”. “eis aqui o meu Filho muito amado em quem tenho todas as
minhas complacências” (MT 3,17). Se tem nele todas as suas complacências, é
sinal de que deseja que o imitemos. E assim Nosso Senhor nos diz com toda a sua
confiança: “Ego sum via... memo venit ad
Patrem nisi per me... Dicite a me, quia milis sum et humilis corde... Exemplum
dedi vobis ut quemadmodum ego fecit
vobis, ita et vos fatiatis” (Jo 14,6; MT 11,9; Jo 13,15). E que outra coisa
é em substância, o Evangelho senão a narração dos feitos e maravilhas de nosso
Senhor enquanto são propostos à nossa imitação “coepit facere et docere?” (At 1,1). O que é o cristianismo senão a
imitação de Jesus Cristo? Tanto é assim que São Paulo resumirá todos os deveres
do cristão no imitar a vida de Nosso Senhor: “Imitatores mei estole sicut et ego Christi” (I Cor 4,16). Vejamos,
pois, quais são as qualidades, deste modelo.
Jesus modelos perfeito, até mesmo naqueles que por confissão
não acreditam em sua divindade, Jesus é o protótipo mais acabado de virtude que jamais apareceu
na terra. Praticou as virtudes em grau heróico, e com as disposições interiores
mais perfeitas: Religião para com Deus, amor para com o próximo, aniquilamento
a respeito de si mesmo, horror do pecado e do que a ele pode conduzir e contudo
é modelo imitável e universal, cheio de encanto, cujo os modelos são cheios de
eficácia.
Suportou todos os tormentos |
É o modelo que todos podem imitar, pois se dignou a desposar
as nossas misérias e fraquezas, passar até pela tentação, ser-nos semelhante em
tudo, exceto o pecado: “Nom enim habemus
Pontificem qui non posit compati infirmitatibus nostris; tentatum autem per
omnia pro similitudine absque peccato” (Heb 4,15). Durante trinta anos
viveu a vida mais oculta, mais obscura, mais comum, obedecendo Maria e José,
trabalhando como um aprendiz e operário, “fabri
filius” (Mt. 13, 55), e por esse modo veio a ser o modelo mais acabado da
maior parte dos homens que não tem senão deveres obscuros, e que hão de santificar
no meio das ocupações mais comuns. Mas teve também a sua vida pública: praticou
o apostolado, quer por meio de uma escola, formando seus apóstolos, quer entre
o povo evangelizando as multidões. Gozou da amizade de alguns e teve que
suportar a ingratidão de outros. Teve os seus triunfos e seus reveses; num a
palavra passou pelas vicissitudes de todo o homem que tem relações com amigos e
com o público, A sua Paixão deu-nos o exemplo da sua paciência mais heróica no
meio das torturas físicas e morais que tolerou não somente sem se queixar, mas
pedindo até pelos seus algozes. E não se diga que, sendo Deus sofreu menos. Era
homem também; dotado de finíssima sensibilidade, sentiu mais vivamente que nós
poderíamos sentir a ingratidão dos homens o desamparo dos seus amigos, a
traição de Judas. Experimentou os tais sentimentos de tédio, de tristeza de
pavor, que não pode deixar de orar para que o cálice da amargura se afastasse
dele, se era possível; e a Cruz, soltou este grito lancinante, que bem mostra a
profundeza de suas agonias: “Deus, Deus
meus, ut quid deleriquisti me?” (MT 27,46). Foi pois um modelo universal.
(Fonte:
Compêndio de Teologia e Ascética e Mística - AD. Tanquerey - 1961)
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