Teologia Ascética e Mística: Das virtudes e dos dons ou das faculdades da ordem sobrenatural - Da graça atual III
Devemos, pois ter uma maior estima pela vida na graça, já
que é uma vida nova; esta é uma vida nova que nos une e nos assemelha a Deus, e
com todo o organismo necessário a sua atividade. Se a vida intelectual está
muito acima da vida vegetativa e sensitiva, a vida cristã transcende
infinitamente a vida simplesmente racional. E na verdade, esta é devida ao
homem, desde que Deus a resolve criá-lo, ao passo que a vida da graça supera
todas as atividades e merecimento das mais perfeita das criaturas. Pois, quem
poderia jamais reclamar o direito de ser constituído filho adotivo de Deus, e o
templo do Espírito Santo, ou o privilégio de ver a Deus face a face, como e Ele
mesmo se vê a si mesmo? Devemos, pois estimar esta vida, mais que todos os bens
criados considerá-la como um tesouro escondido, para cuja aquisição ninguém
deve hesitar em vender tudo o que possui.
Um vez que se entrou na posse deste tesouro, é mister
sacrificar tudo antes de expor-se a perdê-lo. É a conclusão que tira o papa São
Leão: “Agnosce, o Christiane, dignitatem
tuam, et, divinae consors factus naturae, noli in veterem, vilitatem, degeneri
conversatione redire.”
Ninguém mais que o cristão se deve respeitar a si mesmo, não
certamente por causa dos próprios méritos, senão por causa desta vida divina que
participa, e por ser templo do Espírito Santo, templo sagrado, cuja beleza não é
lícito contaminar: “Domum tuam decet sanctitudo
in longitudinem dierum”.
Mais ainda: devemos evidentemente utilizar, cultivar, este
organismo sobrenatural de que somos dotados. Se aprouve a divina bondade elevarmos a um estado superior, conceder-nos
profundamente virtudes, e dons que aperfeiçoam as nossas faculdades naturais,
se nos oferece a cada instante a sua colaboração, para as fazermos render,
seria mostrar-nos bem poucos reconhecidos à sua liberalidade rejeitar esses
dons, não praticando senão atos naturalmente bons, ou não fazendo produzir mais
que frutos imperfeitos à vinha da nossa alma. Quanto mais se mostrou generoso o
doador, quanto mais ativa e fecunda deve ser a colaboração que de nós espera. Isto
nos aparecerá mais claramente ainda depois de estudarmos a parte de Jesus na
vida cristã.
(Fonte:
Compêndio de Teologia e Ascética e Mística - AD. Tanquerey - 1961)
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