Liturgia Católica: O PAPA TEM O PODER DE MUDAR O RITO?


Dito isto, vamos à nossa questão: o Papa tem direito de modificar um rito que remonta à tradição apostólica, tal como se formou ao longo dos séculos? Na parte precedente temos mostrado que a autoridade eclesiástica nunca exerceu influência notória na evolução das formas litúrgicas. Limitando-se a sancionar o rito nascido do costume e ainda isso o fez tarde, sobretudo depois da aparição de livros litúrgicos impressos e no Ocidente somente depois do Concílio de Trento.

A isto fazia alusão o artigo 22 da Constituição Litúrgica, ao se referir ao “Codex Iuris canonici” (cân. 1257), onde se pode ler: “Regular a sagrada Liturgia compete ùnicamente à autoridade da Igreja, a qual reside na Sé Apostólica e, segundo as normas do direito, no Bispo... Por isso, ninguém mais, mesmo que seja sacerdote, ouse, por sua iniciativa, acrescentar, suprimir ou mudar seja o que for em matéria litúrgica”. O Concílio não explicou em detalhes o que se deve entender pelo “governo/moderação da sagrada liturgia (sacrae liturgiae moderatio)”. De acordo com os costumes existentes, não se pode tratar aqui de uma completa reorganização do rito da missa, nem da totalidade dos livros litúrgicos, tal e como o temos vivido. 

Pode-se deduzir do contexto que os padres conciliares queriam antes de tudo impe dir que cada sacerdote arrumasse os ritos “à sua maneira” que, como se sabe, atualmente é moda. Os reformadores tampouco podem se apoiar no artigo 25 da Constituição litúrgica, que diz: os livros litúrgicos serão revisados (“recognoscantur”) o quanto antes. O “Ordo missae” publicado em 1965, o que agora questionamos, mostra como, em sua origem e de acordo com as decisões do Concílio, se tinha concebido a revisão do rito da missa. O decreto de introdução diz expressamente que esta reorganização (“nova recensio”) do “ordo missae” se realizou sobre a base de “mutationes” da Instrução para a aplicação da Constituição litúrgica.

Todavia a 28 de maio de 1966, o então secretário de Estado, Cardeal Cicognani, dirigia em nome do Papa ao arcipreste de Beuron, que lhe havia enviado o novo missal Schott (pós-conciliar), uma carta de agradecimento, onde declarava: “A característica e o ponto essencial desta nova edição reformada22 é que é o resultado perfeito da Constituição litúrgica do Concilio”. Por conseguinte nem uma só palavra sobre o fato de que ainda se teria que esperar uma nova e mais ampla reestruturação do missal.

Sem dúvida, apenas três anos mais tarde, o Papa Paulo VI surpreendia o universo católico com a publicação de um novo “Ordo missae” que levava a data de 6 de abril de 1969. Enquanto a revisão de 1965 havia deixado intacto o rito tradicional contentando-se, sobretudo em conformidade com o artigo 50 da Constituição litúrgica, em descartar do “ordo” da missa qualquer acréscimo posterior, com o “ordo” de 1969 se criava um novo rito. Assim pois, o “ordo” existente até aqui não foi revisado no sentido como o entendia o Concílio, mas se encontrava totalmente abolido, mais ainda, alguns anos mais tarde, expressamente proibido.

Fonte: A Reforma Litúrgica Romana - Monsenhor Klaus Gamber - Fundador do Instituto - Tradução por Luís Augusto Rodrigues Domingues (Teresina, PI - 2009) - Litúrgico de Ratisbona - Revisão por Edilberto Alves da Silva.

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