Teologia Ascética e Mística: Condições tiradas do sujeito em si mesmo.


Como os atos de virtude informados pela caridade não perdem o seu valor próprio, daí resulta que um ato de fé, por diversas intenções ao mesmo tempo, será mais meritório. Assim, um ato de obediência aos Superiores, feito por um duplo motivo: respeito para com a sua autoridade, e juntamente amor de Deus que se ve na pessoa do superior terá o duplo mérito da obediência  e da caridade. O mesmo ato pode ter assim um tríplice, um quadruplo valor; detestando os meus pecados, por serem ofensas de Deus, posso ter intenção de praticar ao mesmo tempo a penitência, a humildade e o amor de Deus; este ato é triplicadamente meritório. É, pois, útil propor-nos várias intenções sobrenaturais. Importa porém, evitar o excesso de buscar com demasiada ansiedade multíplices intenções, porque isso lançaria a pertubação da alma. Abraçarias que se nos apresentam como espontaneamente, e subordiná-las à divina caridade, tal o meio de de acrescentar os méritos, conservando a paz  de alma.

Como a vontade do homem é mutável, é necessário tornar explícitas e atualizar frequentemente as nossas intenções sobrenaturais; alias, sucederia que um ato começado por Deus, se continuaria sob o influxo da curiosidade, da sensualidade ou do amor próprio, perderia assim uma parte do seu valor: digo uma parte, pois, como as intenções subsidiárias não destroem completamente a primeira, o ato não deixa de ser sobrenatural e meritório no seu todo. Quando um navio, separado de Brest, toma rumo para Nova Iorque, não basta dirigir, uma vez por todas a proa para aquela cidade; como a maré, os ventos e as correntes tendem a fazer desviar o navio da sua derrota, é mister, por meio do leme, reconduzi-lo incessantemente à direção primitiva. Assim com a nossa vontade, não basta orientá-la uma uma vez, nem sequer todos, para Deus; as paixões humanas  e as influências externas depressa a fariam desviar da linha reta; é necessário, com um ato explícito reconduzi-la amiúde para Deus e para a caridade. Então permanecem as nossas intenções constantemente sobrenaturais, e até perfeitas, e muito meritórias, sobretudo se a isso acrescentamos o fervor da ação.

A intensidade ou o fervor com que se opera. Podemos, efetivamente, proceder, ainda menos praticando o bem com desleixo, com pouco esforço, ou, ao contrário, como ardor, com toda a energia de que somos capazes, utilizando toda a energia de que somos capazes, utilizando toda a graça atual posta a nossa disposição. É evidente que o resultado destes dois casos será bem diferente. Se operarmos com indolência, não adquirimos senão poucos merecimentos e até por vezes nos tornamos culpados de alguma falta venial, - que, aliás, não destrói todo o mérito; se, pelo contrário oramos, trabalhamos e nos sacrificamos com toda alma, cada uma das ações merecem uma enchente preciosa de graça habitual. Sem entrar aqui em hipóteses discutíveis, pode-se dizer com certeza que, visto Deus retribuir centuplicadamente o que por Ele se faz, uma alma fervorosa adquire cada dia um número muito considerável de graus de graça e se torna assim em pouco tempo perfeitíssima, conforme a palavra da Sabedoria: "Cegando em pouco tempo a perfeição, perfez uma longa carreira. Consummatus in brevi explevi tempora multa (Sabedoria 4, 13). Que precioso iniciamento ao fervor, e como vale a pena renovar amiúde os esforços, com energia e perseverança.

(Fonte: Compêndio de Teologia e Ascética e Mística - AD. Tanquerey - 1961)


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